A América Latina é a região com maior
índice de acesso à terapia antirretroviral, atingindo cerca de 70% da
população, afirmou nesta quarta-feira (18/07) o coordenador do Unaids
(Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/Aids) no Brasil, Pedro
Chequer, durante apresentação de um novo relatório sobre os avanços no
combate à doença, em Brasília.
O melhor acesso à terapia antirretroviral ajudou a reduzir o número
anual de mortes relacionadas à aids na América Latina de 63 mil para 57
mil em dez anos.
Parte deste cenário positivo se deve ao Brasil. "Já nos anos 1990,
contrariando a opinião de instituições como o Banco Mundial e também da
Europa e dos Estados Unidos, o país adotou uma política de Estado e,
apesar de adversidades financeiras, mantém essa posição", comentou
Chequer. Ele disse que a meta de zerar, em três anos, as infecções em
crianças pode ser alcançada.
O relatório também destaca a autossuficiência brasileira no
financiamento do programa de combate ao HIV, o vírus causador da aids.
Segundo o Ministério da Saúde, o país produz hoje 10 dos 20
medicamentos distribuídos no tratamento e o país conseguiu uma economia
de 95 milhões de dólares entre 2007 e 2011. Segundo Chequer, essa queda
está relacionada com a diminuição de preços de medicamentos não
produzidos no país. Mas ele adverte: "Há a necessidade de se utilizar
mais as flexibilidades do acordo de Doha e fazer com que os países
possam produzir genéricos localmente, independentemente da existência
de patentes".
Conservadorismo religioso
Chequer lembrou que o Brasil é referência em campanhas de
conscientização, mas ressaltou que o país corre o risco de um
retrocesso nessa área devido ao conservadorismo religioso. "Na medida
em que procura atender demandas de alguns segmentos sociais, o Brasil
corre risco de retrocesso. Mas confiamos na equipe técnica do
Ministério da Saúde e no entendimento que o país tem sobre os direitos
humanos. Entendemos isso como uma situação passageira."
Ele estava se referindo a um recente episódio em que um vídeo da
campanha de prevenção à Aids voltado para jovens gays, lançado este ano
pelo governo brasileiro em parceria com a ONU, deixou de ser exibido na
televisão aberta, ficando restrito a ambientes fechados, como boates. A
medida sofreu críticas de movimentos de defesa dos direitos dos
homossexuais.
O coordenador brasileiro da Unaids também criticou a suspensão da
distribuição nas escolas da rede pública de kits com material educativo
para conscientizar crianças e jovens a respeito da diversidade de
opções sexuais. Em resposta, o representante do Ministério da Saúde,
Dirceu Greco, garantiu que "a política brasileira continua caminhando
no sentido do respeito aos direitos humanos", mas ressaltou que o país
é composto de três poderes, fazendo referência às atribuições distintas
do Legislativo, Executivo e Judiciário.
Chequer lembrou ainda que o Brasil é o país onde há mais crimes
homofóbicos no mundo, seguido de México e Estados Unidos. "Esperamos
que a sociedade civil se mobilize e o Congresso aprove a lei que
criminaliza a homofobia. É uma lacuna importante e esperamos que
aconteça ainda em 2012", disse o coordenador do Unaids no Brasil,
referindo-se ao projeto que está atualmente em tramitação no
legislativo brasileiro.
Comprimido controverso
Apesar de a Unaids ter elogiado a recente decisão do governo norte
americano de aprovar o uso de terapia antirretroviral para prevenir a
transmissão do HIV, o representante do programa no Brasil disse que é
uma notícia que deve ser recebida com ressalvas.
"Há outras pesquisas que têm tanta ou maior relevância do que esta,
como aquelas que estudam o uso de retrovirais para reduzir o risco de
transmissão entre parceiros sexuais", disse Chequer. "Seria ético
destinar milhões de comprimidos a pessoa que não estão infectadas em
detrimento de 8 milhões que necessitam de tratamento e ainda não têm
acesso?", questionou. Ele lembrou que ainda não é possível produzir a
quantidade de medicamento necessária para tratar todos os infectados.
Greco disse que não existe pílula mágica e alertou para outro
aspecto negativo do uso amplo do novo medicamento: o risco de os
usuários do comprimido se sentirem tão seguros com a promessa de
proteção e suspender outros métodos de prevenção, como a camisinha.
Num gesto que arrancou risos dos repórteres durante a coletiva em
Brasília, Greco tirou dos bolsos dezenas de preservativos. O gesto teve
como objetivo, segundo Greco, chamar a atenção para o risco e para
dizer, também, que não basta ter o preservativo do bolso, mas é preciso
ter a consciência de que o preservativo é hoje a maneira mais eficiente
de evita Aids.
Autora: Ericka de Sá, de Brasília
Revisão: Alexandre Schossler
Revisão: Alexandre Schossler
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